domingo, 23 de fevereiro de 2014

BetterOffDEAD

Flatbush Zombies                                                                                8/10
Electric KoolAde Records, 2013





"Mente forte, corpo firme"


   O hip-hop é um estilo de música curioso. Confesso que, por muitos anos, tive um grande preconceito com este género, algo do qual não me orgulho minimamente. E até hoje em dia, não posso dizer que seja o estilo de música que mais acompanho ou aprecio, mas a verdade é que o rap possui um "algo" subjacente, que o torna muito mais que um mero conjunto de vocais disposto sobre uma batida electrónica. Os Flatbush Zombies, grupo de Brooklyn constituído por Eric "Arc" Elliott, Zombie Juice e Meechy Darko, vêm comprovar exactamente isso na sua segunda mixtape, agregando aí o espírito do movimento "Beast Coast" da costa leste americana. 

   "BetterOffDEAD" é um incrivelmente bem-sucedido esforço, constituindo nada mais, nada menos que 66 minutos de hip-hop agressivo, carismático, e directo: desde a charmosa introdução de "Amerikkkan Pie", somos instantâneamente envolvidos pelas inteligentes rimas e abrasivas batidas dos Zombies. Percebemos, no entanto, que este não é um álbum de hip hop comum, seja pelas impressionantes transições empregues de música para música, que incluem "voice-overs" e emuladores de rádio de todos os tipos, seja por recursos que normalmente não se vêem num disco deste género musical: a bateria proeminente em "Nephilim" e "MinePhuck", que substitui o "beat" de forma bastante convincente; os belissimamente executados vocais de apoio em "Palm Trees", que dão um toque especial à faixa; ou os vários tons de guitarra, piano e cordas dispostos às pinceladas do começo ao fim do disco. Cortesia da produção, que de facto faz um excelente trabalho não só na secção instrumental, mas também na diversidade de texturas, contrastando não raro uma sonoridade mais aberta e dinâmica com uma mistura mais abafada durante este álbum.

   No que diz respeito aos vocais, o grupo apresenta-se como raramente repreensível, tirando partido dos seus recursos e revertendo-os a seu favor: os vocais mais agudos e gritantes de Zombie Juice contrastam com os mais graves e roucos de Meechy Darko, uma mistura que impede a saturação da voz e age em seu benefício. Os seus versos são-nos entregues com uma garra extraordinária, e num tom de voz que, sendo muitas vezes ondulante, não deixa de ter a fluidez necessária ao sucesso destas faixas. Liricamente, o disco também é interessante, não se ficando pelo "Rap 101" (o que é sempre prazeroso de se ver) e abordando temas como a crítica social, a condição humana, a fama e a morte. As suas letras são ambiciosas, sem dúvida, mas com resultados variados, o que acaba por dificultar o aproveitamento total desta mixtape. Versos como "If rap was illegal you bitch niggas wouldn't even write a bar/Shit, I'd probably be behind bars" não deixam de soar bem, mas algumas falhas pontuais impedem este trabalho de ser uma obra-prima lírica, como o imperdoável excesso de "fucks" em "Bliss", a inescrupulosa listagem de drogas em "Drug Parade", o que raramente resulta numa música, e a ocasionalmente mal-calculada "Death" (perdoem-me se não considero "Kurt Angle" uma boa referência musical).

   O álbum disfruta de uma atmosfera muito própria, de carácter muito intenso, pesado e até violento por vezes, que lhe proporciona os seus melhores momentos: a socialmente consciente "Amerikkkan Pie", a aterradora "Nephilim", as negras "Death" e "Death 2", a breve mas alucinante "MindPhuck", a agressiva "LivefromHell", para enumerar algumas. É na interrupção desta atmosfera, portanto, que o disco perde qualidade. Sendo "Palm Trees" a mais óbvia excepção, músicas de natureza mais alegre acabam por perder-se no clima geral do álbum, diminuindo a sua coesão e firmeza. Deixo como exemplo as insossas "222", "GOD Blessed" e "Club Soda".

   "BetterOffDEAD" não deixa de ser, apesar disso, um excelente esforço, e sendo apenas a segunda mixtape de um grupo tão recente, dá animadores indícios sobre o futuro de Elliott, Juice e Darko. Deixando algumas imperfeições de parte, somos aqui apresentados a "beats" originais, versos bem medidos e uma atitude absolutamente implacável. Os Flatbush Zombies trazem-nos um belo conjunto de músicas que faz jus ao nome que defendem e que promete um futuro brilhante para estes rapazes de Brooklyn.

2 comentários:

  1. Olha achei uma crítica astante completa e "justa" tendo em conta que nem deves ser grande apreciador de rap, mas ya estes sao diferentes.
    Atenção que a grande maioria dos instrumentais são produzidos pelo Erick Arc Elliot, tou a prever o gajo como o próximo J-Dilla

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    1. Obrigado! Sim, a produção dele está excelente - um grupo que vale a pena acompanhar.

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